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Infeção por VIH: Evolução terapêutica em Portugal
Nov 30, 2024

Desde o primeiro caso de infeção por VIH notificado em Portugal, em 1983, que diversas estratégias foram implementadas ao longo das últimas décadas, com objetivos amplos que incluem a prevenção de novas infeções, a garantia do acesso universal ao tratamento, a redução do estigma e discriminação, e o aumento da literacia associada à patologia. Esses esforços têm contribuído para mitigar o impacto da infeção por VIH, mas o desafio ainda persiste. Até ao final de 2022, existiam mais de 66.061 casos de infeção notificados em Portugal e, embora se verifique uma tendência de redução, a taxa de novos casos continua a ser superior à média dos países da União Europeia, evidenciando a necessidade de reforço contínuo das políticas de saúde pública.1

A abordagem terapêutica para o VIH evoluiu significativamente, acompanhando os avanços científicos e tecnológicos que alteraram o prognóstico da infeção. Atualmente, o arsenal terapêutico conta com mais de 30 antirretrovirais, disponibilizados individualmente ou em combinações, totalizando um total de cerca de 45 diferentes tipos de medicamentos (originadores ou genéricos, quando existentes) disponíveis para o VIH.2

Nos últimos cinco anos, foram introduzidos 8 novos medicamentos no mercado hospitalar português, nos quais se incluem diferentes antirretrovirais (ainda que maioritariamente de classes farmacoterapêuticas já existentes), novos regimes de comprimido único e antirretrovirais de longa duração.2

Essas inovações permitiram a introdução de regimes mais eficazes e convenientes, e com menor frequência de tomas diárias, o que permitiu melhorar a qualidade de vida dos doentes, reduzir o risco de abandono do tratamento e facilitar a gestão clínica da doença.

Gráfico 1 – Percentagem de doentes em tratamento com regimes de comprimido único. IQVIA HIV Analytics, Outubro 2024.

A simplificação de regimes tem sido uma tendência que se tem consolidado ao longo do tempo. Os regimes de comprimido único começaram a ganhar expressão a partir de 2009 e, atualmente, cerca de 84% dos doentes em Portugal são tratados com este tipo de abordagem terapêutica, representando 78% dos encargos em valor no tratamento da infeção por VIH.2,3

Apesar da variabilidade disponível para a instituição de regimes terapêuticos, presentemente existe uma maior concentração de doentes em idêntica abordagem terapêutica. Os cinco regimes mais prescritos abrangem 79% dos doentes em tratamento e todos eles se tratam de associações de toma única. Contudo, a ampla diversidade de opções existente permite que mais de 200 combinações de regimes estejam igualmente a ser utilizadas em doentes mais complexos, refletindo a necessidade de personalização dos tratamentos de forma a atender às necessidades específicas de cada doente.3

Os Inibidores da Integrase (INSTI) têm-se consolidado como a principal classe terapêutica em utilização, geralmente em combinação com nucleosídeos ou nucleotídeos inibidores da transcriptase reversa (NRTIs), e estão presentes em 81% dos doentes em tratamento.3

Gráfico 2 – Percentagem de doentes em tratamento com inibidores da integrase (INSTI’s). IQVIA HIV Analytics, Outubro 2024.

A inovação terapêutica, embora essencial, apresenta também desafios para a sustentabilidade do Sistema Nacional de Saúde. O encargo hospitalar com o tratamento da infeção por VIH atingiu um total de 246 milhões de euros nos últimos 12 meses, verificando-se um crescimento de 10,2% em relação ao período homólogo. Este encargo tem sido parcialmente aliviado pela introdução de medicamentos genéricos, sendo que estes representam atualmente 27% das unidades consumidas no mercado. Avaliando os regimes que se encontram instituídos, apenas 12% dos doentes têm prescritos regimes que incluem na sua constituição um ou mais antirretrovirais para os quais existem genéricos no mercado.2,3

Outro aspeto importante a ter em consideração é o perfil demográfico dos doentes em tratamento. Cerca de 67% dos doentes encontram-se na faixa etária acima dos 45 anos de idade, o que reflete um envelhecimento progressivo da população infetada. Este perfil, associado ao aumento da longevidade, acarreta a necessidade de implementação de medidas que visem a gestão de efeitos adversos do tratamento a longo prazo do tratamento e das comorbilidades associadas ao envelhecimento, e a procura de uma adesão contínua ao tratamento. Estes fatores têm um impacto direto na sustentabilidade do SNS e são críticos na formulação de estratégias de saúde pública.3

Apesar dos progressos alcançados, a gestão da infeção por VIH precisa continuar a adaptar-se aos avanços científicos e às mudanças nas necessidades dos doentes. Existe um compromisso generalizado e consistente na luta contra o VIH/SIDA, mas a manutenção desse progresso vai requerer esforços contínuos e a implementação de medidas que permitam garantir a saúde e o bem-estar dos doentes a longo termo.

Gisela Videira
Associate Director
Offering Management

1 Relatório “Infeção por VIH em Portugal – 2023” - Ministério da saúde Direção-Geral da Saúde | Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge
2 Hospital Vision – Outubro 2024
3 IQVIA HIV Analytics – Outubro 2024

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